segunda-feira, 3 de junho de 2013

A nova mulher da nova classe C

O crescimento econômico fez nascer
uma consumidora exigente e capaz
de expandir um mercado até então tímido



Thereza Venturoli



A paulistana Patricia de Amorim Rocha, a moça da foto na página ao lado, está com 36 anos, é casada e mãe de uma menina de 10 anos. Filha de imigrantes nordestinos, tem o ensino médio completo, mas já trabalhava informalmente desde os 11 anos de idade para complementar a parca renda familiar conseguida pela mãe, diarista, e pelo pai, operário da construção civil. Foi operária e funcionária do setor administrativo numa fábrica de brinquedos. Fez um curso de empreendedorismo e foi contratada por uma indústria de panelas. Desistiu do emprego de carteira assinada para montar uma sorveteria – que também se mostrou pouco rentável. Há cinco anos, enfim, desistiu de tudo para se dedicar à venda direta de cosméticos – atividade que lhe rende seis vezes mais que os empregos que já teve com carteira assinada.
Consultora de beleza, Patricia é responsável por 60% do dinheiro do lar. Ancorada no sucesso dela, a família trocou o fogão, comprou um computador com acesso à internet e estacionou na garagem um carro zero-quilômetro, comprado em 2008, em 24 prestações. "Prazo bem curtinho mesmo, que é para a gente não se meter em dívidas que não acabam mais", diz Patricia. O próximo passo é trocar o televisor e terminar de pagar as prestações da casa própria em Itaquaquecetuba, na Grande São Paulo. "Lá teremos uma suíte para o casal", afirma Patricia. A filha, Jenifer, estuda em escola pública. A razão é, de novo, cuidado com os gastos: "A escola municipal é boa. Então deixamos para pagar uma escola particular quando ela avançar mais nos estudos". De planejamento em planejamento, Patricia tem certeza de que vai conseguir mais: cursar uma faculdade de economia, viajar nas férias e, um dia, quem sabe, fazer uma cirurgia plástica no abdômen.
Patricia, sorridente e despachada, vivíssima, poderia ser traduzida em números. Ela é uma legítima representante da nova mulher da nova classe média brasileira. Entre 2003 e 2008, cerca de 27 milhões de brasileiros das classes D e E subiram de patamar social e hoje compõem os 91 milhões de cidadãos da classe C. São filhos do crescimento econômico, da expansão de empregos e do fim da inflação, fenômenos recentíssimos no Brasil. As mulheres, indutoras de consumo, têm papel fundamental nesta sociedade que se expande. Segundo o instituto Data Popular, elas são 36 milhões, que, até o fim deste ano, terão movimentado 158 bilhões de reais, o equivalente a 30% da renda de todas as brasileiras. "Aberta às novidades tecnológicas, atenta à importância da educação e consciente de seu poder aquisitivo, essa mulher, que tem pela primeira vez algum dinheiro para gastar com itens não essenciais, preocupa-se em crescer profissionalmente, aumentar a renda e, assim, poder comprar mais, com cautela", diz Fábio Mariano, sociólogo especializado em comportamento do consumidor, da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM), em São Paulo. "Com isso, está desenvolvendo um imenso mercado de consumo que segue regras próprias." As mulheres da classe C, ainda segundo o Data Popular, são também as que mais levam dinheiro para casa: contribuem, em média, com 41 reais a cada 100 reais da renda familiar. Na classe A, a participação feminina é de 25 reais a cada 100. Isso significa que nas funções que exigem menos preparo as mulheres ganham mais do que os homens – ao contrário do que ocorre nas camadas mais altas da pirâmide. Coerentemente, 30% das famílias de classe média são chefiadas por mulheres. Na classe A essa proporção é de 22%.
Com todo esse poder na bolsa, as emergentes representam mais de 50% dos clientes das farmácias, dos supermercados e das lojas de roupas. Para cada dez homens de classe média que fazem compras nos shoppings, há doze mulheres. Elas avançam, também, em tradicionais nichos de consumo masculino, como seguradoras e bancos: 62% das mulheres têm cartão de crédito, contra 59% dos homens da mesma classe social. Há quem aposte que, em dez anos, elas serão maioria absoluta entre os clientes nos estandes de vendas de apartamentos e nas concessionárias de automóveis. Alguma dúvida? O futuro parece uma longa estrada quando se acompanha com atenção uma outra estatística: dos 7,5 milhões de mulheres da classe C com idade entre 16 e 24 anos, 73% já ingressaram no mercado de trabalho. Outros 25% estão na faculdade ou de posse do canudo. Os filhos são importantes, mas a razão da existência vai além da prole: 36% das jovens ouvidas pela pesquisa citam como maior sonho a realização profissional. As cifras parecem refletir Patricia.


Nenhum comentário:

Postar um comentário